Sunday 28 April 2013

Ernesto Nazareth: "Batuque" (Tango Característico)



A  postagem de hoje contempla a vida, obra e estilo de composição do grande compositor brasileiro Ernesto Nazareth – cujo sesquicentenário comemoramos neste ano de 2013.   
 
Ernesto Júlio de Nazareth (1863-1934), célebre compositor e pianista brasileiro do final do século  XIX/início de século XX , é especialmente conhecido por sua inestimável contribuição ao Tango Brasileiro[1] (um subgênero do choro[2]) . Influenciado pelo Romantismo europeu (sobretudo por Chopin), pela música afro-brasileira (como exemplo, o lundu[3]) e o ragtime americano,  Nazareth compôs mais de 200 peças para piano solo  -  dentre as quais 88 Tangos Brasileiros,  41 valsas, 28 polcas e numerosas peças em uma variedade de outros gêneros (sambas, Schottisches, fox-trots, quadrilhas, mazurcas de expressão, entre outros).   

Nazareth foi reconhecidamente o compositor brasileiro responsável por traduzir  o espírito do Rio antigo – com seus cafés, eventos sociais e bailes –  em linguagem erudita, mediante estilo notavelmente refinado. Considerada como um híbrido de erudito e popular, sua música integra  os currículos tanto de piano clássico como de piano popular nas escolas, conservatórios e universidades.

Ernesto Nazareth nasceu no bairro carioca do  Porto,  Rio de Janeiro, filho de Vasco Lourenço da Silva Nazareth e de D. Carolina Augusta da Cunha Nazareth. Iniciou seus estudos de piano com a própria mãe, posteriormente dando-lhes continuidade com  Eduardo Rodolpho de Andrade Madeira e Charles Lucien Lambert (amigo próximo do compositor  Louis Moreau Gottschalk).

Aos quatorze anos, compôs sua primeira peça para piano – uma polca entitulada “Você Bem Sabe”. À mesma época, iniciou sua carreira profissional como pianista  em cafés, bailes e salas de espera de cinemas. Começou a escrever tangos em 1870, e em 1871 compôs seu primeiro sucesso  – o  tango “Não Caio Noutra!!!”.  O reconhecimento internacional veio com o tango  “Brejeiro” –  interpretado e gravado pela banda da  Garde républicaine em Paris, e posteriormente publicado tanto na França como nos Estados Unidos.  

Em 1886, o compositor casou-se com Theodora Amália Leal de Meirelles, com quem teve quatro filhos - Eulina, Diniz, Maria de Lourdes and  Ernestinho.   

Em 1904, "Brejeiro" foi gravado pelo cantor Mário Pinheiro sob o título "O Sertanejo Enamorado", com letra de Catulo da Paixão Cearense. No ano seguinte, Nazareth participa de um recital no Instituto Nacional de Música, interpretando a  gavotte “Corbeille de fleurs”. 



De 1909 a 1913, Nazareth atuou como pianista na sala de espera do famoso Cinema Odeon, no Rio de Janeiro – o qual muitas personalidades ilustres frequentavam só para ouvi-lo tocar. Foi no Odeon que ele conheceu o pianista  Arthur Rubinstein e o compositor Darius Milhaud  - que citou muitas de suas composições em suas obras,  tais como o balé  Le Boeuf sur le Toit e a suite Saudades do Brasil, além de plagiar o famoso  “Brejeiro”  em sua peça Scaramouche[4].  

Em homenagem à famosa sala de cinema,  em 1909 Nazareth compôs o  tango “Odeon”, dedicando a peça “à distinta  Zambelli & Cia."[5], proprietária do Cinema. 

Em 1926 o compositor embarca em turnê no estado de São Paulo – a qual dura onze meses – tocando no Conservatório Dramático e Musical de Campinas e no Teatro Municipal de São Paulo. Naquele mesmo ano, durante conferência sobre a obra de Nazareth na Sociedade de Cultura Artística de São Paulo, o musicólogo e escritor  Mario de Andrade afirmaria: “(...) muitas das composições deste mestre de dança brasileira são criações magistrais, em que a força conceptica, a boniteza da invenção melódica, a qualidade expressiva, estão dignificadas por uma perfeição de forma e equilíbrio surpreendentes".

Retornando ao  Rio de Janeiro in 1927, Nazareth foi um dos primeiros artistas a tocar na  Rádio Sociedade (atual  Rádio MEC do Rio de Janeiro). No mesmo ano a valsa “Resignação”, sua última composição, foi publicada.  

No final da década de 1920, seu problema auditivo (causado por uma queda sofrida ainda na infância) se agravou, levando-o à completa surdez em 1933. Esse fato induziu-o a um estado de instabilidade psíquica, que resultou em sua internação em uma clínica neuro-psiquiátrica na Praia Vermelha. Mais tarde,  é transferido para a  Colônia Juliano Moreira no bairro de Jacarepaguá.  

In fevereiro de 1934 Nazareth foge do manicômio. Dias depois, seu corpo é encontrado nas águas da Cachoeira dos Ciganos. Foi sepultado no cemitério de São Francisco Xavier.  

A peça que se segue -  "Batuque (Tango Característico)" - foi publicada em 1913 pela Casa Arthur Napoleão (Sampaio, Araújo & Cia.) e dedicada ao grande compositor erudito e pianista brasileiro Henrique Oswald - a quem Nazareth também conheceu no Odeon. Observe a divisão rítmica binária característica do Tango Brasileiro, bem como o típico ritmo sincopado do gênero.  

Interpretado pela grande especialista brasileira em Nazareth, Eudóxia de Barros.

Boa escuta!


Referências: 

1) Artigos:

Pavan, Alexandre, "Chopin Carioca",  in Revista Textos do Brasil , no.12.  Itamaraty - Ministério das Relacoes Exteriores,  Departamento Cultural, pp. 60–61.
Thompson, Daniella.  “As Crônicas Bovinas, Parte 29. A linha tênue entre o tributo e o roubo”. 
http://daniellathompson.com/Texts/Le_Boeuf/cron.pt.29.htm

 2) Websites:

Cliquemusic: Artista: Ernesto Nazareth
http://cliquemusic.uol.com.br/artistas/ver/ernesto-nazareth

Ernesto Nazareth
http://cliquemusic.uol.com.br/artistas/ver/ernesto-nazareth

Ernesto Nazareth - 150 anos
http://www.ernestonazareth150anos.com.br/

Ernesto Nazareth. Dicionário Cravo Albim de Música Popular Brasileira
http://www.dicionariompb.com.br/ernesto-nazareth/critica

 

[1] O Tango Brasileiro (também conhecido como  “maxixe”) originou-se no Rio de Janeiro nos anos 1860.  Tem suas origens em danças afro-brasileiras e na polca europeia. O gênero é também definido como uma variante fortemente sincopada da habanera cubana.  
[2] O choro é um estilo musical popular típico do Rio de Janeiro de fins do século XIX. Caracteriza-se pelo uso frequente de síncopes e do contraponto, pelo ritmo alegre e acelerado e pela improvisação virtuosística dos músicos das rodas de choro – denominados “chorões”.  Originalmente, o choro era tocado por um trio de violão, flauta e cavaquinho. Esse tipo de composição é geralmente escrito em três partes, em forma rondó, com cada seção em uma tonalidade diferente (geralmente a seuquencia tonal  é:  tônica – relativa –  subdominante)
[3] O lundu é um estilo musical híbrido, derivado do batuque trazido pelos escravos bantos de Angola e dos elementos melódicos e harmônicos das danças portuguesas.  
[4] Daniella Thompson,  "As Crônicas Bovinas, Parte 29. A linha tênue entre o tributo e o roubo".  http://daniellathompson.com/Texts/Le_Boeuf/cron.pt.29.htm

[5] Ernesto Nazareth – 150 anos I obra I Odeon http://www.ernestonazareth150anos.com.br/Works/view/136

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